sábado, fevereiro 21, 2009

Mãe, não quero nada...




MÃE, NÃO QUERO NADA.
Nossa Senhora do Bom Conselho
Vim apenas te ver.
Não leves a mal
que eu esqueça
os pedidos que me fizeram
para eu te fazer.


Não é egoísmo, Senhora,
e a prova é que não farei também
nenhum pedido para mim,
nem desejo serenar-me,
contemplando teu rosto sereno.


Em nome de todos os homens
que vivem te suplicando,
em nome de todos os irmãos
que já se aproximam de ti
de mãos estendidas,
deixa que eu esqueça um momento
o vale de lágrimas,
nossa miséria de mendigos,
nossa pobreza de criaturas,
nossa tristeza de pecadores,
para saudar-te,
Rainha dos Anjos
Virgem-Mãe de Deus!


Bendito seja o Criador
de tuas mãos sem mancha
por onde passa toda a luz
que tomba sobre a escuridão dos homens!


Bendito seja o Criador
de teu olhar boníssimo
que tem o dom
de acender a esperança
nas almas desalentadas,
nos corações em desespero,
à beira do abismo,
do irremediável,
do fim!


Bendito seja o Criador
de tua sombra suavíssima
pois já notei,
Mãe querida,
que basta a tua lembrança,
o teu perfume
para encher a solidão da vida
a solidão do homem.


Mãe, não quero nada.
Vim apenas te ver.


(Do livro “Nossa Senhora no Meu Caminho”, D. Helder Câmara, Ed. Paulus, 2005)

A minha homenagem a Nossa Senhora e, no centenário do seu nascimento, ao grande Bispo, seu filho também, que vi e ouvi, pessoalmente.

sexta-feira, fevereiro 20, 2009

Era uma vez....


Nasci numa aldeia de pobres entre pobres. No entanto, fui muito rico no Amor dos meus Pais, tudo fazendo para que o essencial não me faltasse. Pão, educação, instrução. Uma infância aos tropeções, ajudando e sendo ajudado a crescer com a realidade dos nossos camponeses. Ao mesmo tempo um menino livre, brincando e correndo descuidadamente pelos campos e ruas, no jogo de "polícias e ladrões" das "escondidas", da "piorreca", do "eixo", do "descanso", da bola de trapos, da "barra", das "nações", do "arrebenta", do "farrapo queimado"... na certeza, quase absoluta, de que ninguém nos fazia mal e, ao mesmo tempo, com a sensação de estar prisioneiro de uma comunidade que assumia a vigilância e a correcção/educação de tudo e de todos, de modo que, se tivesse um "deslize", mesmo antes de chegar a casa já o "telégrafo" se encarregara de accionar o "eu tenho um dedo que adivinha..." da minha Mãe, que nada deixava ocultar. E o respeitinho era muito bonito.
Vem esta introdução a propósito do meu primeiro dia de escola, 7 de Outubro de 1950. O Outono chegara, havia pouco, com o vinho a espumar nas pipas, o odor das nossas maçãs a espalhar-se pelas casas, nos campos as lavras para as sementeiras, as terras a deitar aquele cheiro de encanto provocado pelas primeiras chuvas. As vinhas, já sem uvas, eram então assaltadas pelos rebanhos que, no meio da pobreza quase geral, também para os animais, iam comer as folhas amarelecidas das videiras, enquanto não "rebentavam" da terra as sementes que iriam dar lugar ao verde das novas pastagens.
A manhã daquele dia marcou-me como um ferrete de que não mais conseguiria nem quereria libertar-me. Ainda não eram nove horas e já toda aquela miudagem - os mais novos com as mães - se dirigia para o edifício da escola nova, inaugurado dois anos atrás. Constava-se a presença de um novo professor. O(s) anterior(es) não havia(m) deixado saudades, ouvia dizer. Malhavam mais que ensinavam. Provavelmente avós de futuros ministros... Naquela timidez de garoto de aldeia, ia encolhido e agarrado à saia da minha Mãe. Talvez para impor respeito aquela garotada toda, quase 50 alunos, alguns já com o bigode a despontar, o Professor, ainda jovem, tentava meter alguma ordem com cara de poucos amigos, enquanto fazia as matrículas. Trabalhos simultâneos impossíveis de realizar, hoje! Lá chegou a minha vez de ser arrumado num canto para o fundo daquela enorme sala, onde tudo me era estranho e me senti prisioneiro e infeliz, apesar de ter uma enorme vantagem: a minha Mãe ensinara-me a ler, no Verão anterior. Também fora dela a "pedra" de escrever que ... iria acompanhar-me até sair na 4ª. classe... Estava sentado, apertado contra mais dois companheiros, naquelas "carteiras" ainda novas mas já tão "antigas"... Eu, que correra pelos campos, trepara às árvores, saltara ribeiros, acompanhara as ovelhas e as cabras, cavalgara nos burros e viajara nos carros puxados pelas vacas mansas e pachorrentas, estava agora ali sem saber porquê nem para quê, olhando o tecto daquela sala tão estranha... deitando contas à vida. E que vida! Sete anos e alguns meses!!!
De repente, o assobio subiu, subiu... subiu por aquelas paredes, saiu pelas janelas e fez-me acreditar que já chegara a Primavera e os melros aí estavam para me acordar. No sussurrar daquela sala fez-se um silêncio de "morte" e uma voz que parecia o ribombar de um trovão numa tempestade de Maio ouviu-se como para um despertar de pesadelo:
- Quem foi??? - Quem foi???!!! Quem é que assobiou???
Primeiro, estupefactos, quase a medo, 50 pares de olhos vão-se virando para um garoto perdido e aterrorizado num mundo que lhe estava a desabar em cima. Depois, cheios de coragem, aos olhos esbugalhados juntam-se dezenas de dedos apontando.
- Foi ele!!! Foi ele!!!
- Anda cá, malandro!!!
Levantei-me, a custo. Devagar, muito devagar, apavorado e a tremer, fui percorrendo aquele extenso corredor, interminável, que ia dar à secretária do Professor. Da gaveta saíra, cruel e medonha, uma grande régua de pinho, a estrear...
Quando me aproximei, duas lágrimas rebeldes iam caindo dos meus olhos, em desespero. Não, não a escola não era para mim. "Ó mãe, onde está? Tire-me daqui!!! Ajude-me!!!"
Foi um milagre??? Nossa Senhora da Graça!!! A régua, envergonhada, recolhera à gaveta. O Professor sorriu e disse-me:
- Como te chamas?
- Sou Tó... - balbuciei, soluçando, convulsivamente.
- Pronto, não chores. Mas olha que aqui não se assobia... Vai-te sentar... disse-me, adoçando a voz no que lhe foi possível.
Respirei fundo. Regressei devagar, limpando os cantos dos olhos à manga da blusa.
Assim, o meu primeito professor, "o meu Professor" ganhara um Amigo. E eu também já tinha um novo Amigo. Foi um momento único e estava decidido: havia de ser Professor.
Obrigado, Professor António Antunes Teodósio. Que esteja no Céu. Na Terra, sabe que nunca o esquecerei.

terça-feira, fevereiro 17, 2009

Esperanza!!!

Pronto, já sei!!! Não se atrevem a falar alto, mas é claro que pensam: "Este tipo é mesmo doido! Outro???" Sim, outro - e até poderia escolher mais! - mas este é o tango da minha vida, da nossa vida. Do tudo ou do nada. Do "Sim ou sopas"...
O magusto fora a 1 de Dezembro de 1961, lá na Arrochela, Campo Frio, entre as Aranhas e o Salvador, boas vistas para a Espanha. No meio daquela "malta" do Colégio do Senhor do Calvário, em Medelim, ali reunida para assar as castanhas e fazer uma bela festa, bem à nossa maneira, estava uma gaiata, novita, linda, pelos 15 anos, que eu escolhi de entre todas para lhe farruscar a cara. Como é nosso hábito. "A mim ninguém me farrusca, nunca ninguém me farruscou, nem que não prove as castanhas!!!". Oh! Que palavras, que desafio!!! Ali começava uma aventura que dura até hoje. A história da cara farrusca fica para outra ocasião. Estava-se mesmo a ver, não estava?
Depois houve birras e amuos, "embirro com ele" ou "é uma menina mimada", piscar de olhos e sorrisos, encontros ocasionais ou provocados, levantar bem cedo - ui como custava!!!- para ver passar "a carrinha do colégio", uma espreitadela mais que fugaz e olhares que diziam nada e tudo...
Chegaram as férias do Verão de 1962. Habitualmente, as nossas aldeias realizavam as suas festas populares. As mais famosas da zona eram em Aldeia do Bispo, para além das da sede de Concelho, de vez em quando - ah! em 1960, nas vésperas de entrar em coma, no hospital da Santo António - ainda eu sorria cada vez que nos altifalantes, lá no terreiro da feira, se faziam ouvir, bem ritmados, os acordes do "À média luz"... Outro tango, pois...
Fora dia de feira anual, em AB, e encontrei-a, com a Mãe, às compras. Isto convém "lançar o anzol" às mães para pescar as filhas... "Então, logo à noite vêm à festa?" " Não, não temos ideia..." "Ah! Isto vai ser muito bonito... Que pena... Até cá vem aquele conjunto de C. Branco..., os "Gatos Negros"..." Não prometemos nada... " dizia a Mãe mais que convencida de que eu andava a "arrastar a asa" à filha. O Pai já tinha a certeza: "Olha que "o da mota" passou p´ ponte; não te quero fora de casa..." Feitas as compras num "Até qualquer dia... ou até logo..." me fiquei, coração apertado e ansioso com aquele nem sim nem não...
O Sol recolhera já lá p'ra trás da Serra da Estrela e o arraial, no Largo da Lameira, estava mais que animado. Outros tempos, muita Juventude, a festa a prometer. Os "tchendros" não estavam com meias medidas: sempre de arromba. Eu era filho "adoptado", na primeira Aldeia em que leccionara e fazia parte da festa. No meio da barafunda, faltava qualquer Coisa. E ela veio. Linda, esplendorosa. Pela mão da Mãe. Sim, que a D. Clara não brincava em serviço. Aquilo tinha de passar tudo sob a sua insuspeita fiscalização. Uma filha não se confia a ninguém!!! Outros tempos... outro encanto!!! Pois, era isso que queriam saber???!!!! A nossa primeira dança foi mesmo este tango, dançado desajeitadamente, meio metro afastados. Dançámo-lo muitas e muitas vezes. Melhorando o desempenho nos seus passos, cada vez mais próximos, até bem agarradinhos. Cá estamos com os nossos quatro filhos e os cinco netos. Estes são realmente mais bonitos que os Pais. O tempo passou num instante! Ah! O tango continua a ser nosso. Já desesperava de o descobrir. Aí vai... Para nós continua a ser especial, mas aceitamos que haja quem não goste...
http://www.youtube.com/watch?v=CvOA7EmNpJU

terça-feira, fevereiro 10, 2009

Olé, guapa


Eu confesso! Eu confesso o meu "pecado". Eu sou quase "doido" por tangos, mas este "enlouquece-me" mesmo, arrepia-me, transporta-me para fora deste "vale de lágrimas". Depois de descobrir uma bela interpretação de um conjunto de acordeões, não é que me apareceu a orquestra de André Rieu, numa belíssima versão de 2008???!!! De fazer levantar os cabelos que já não tenho e me levar por tempos em que fui muito feliz. Um momento inolvidável de som, luz e cor! Aposto que também não vão resistir. A não ser que sejam "duros" de ouvido ou tenham .... pés de chumbo! A ouvir e a dançar...
"A menina dança?" Oh! Tempo volta p'ra trás...

terça-feira, fevereiro 03, 2009

Au revoir! AufWiedersehen! Good-bye! Até breve!!!

A manhã está escura nesta "capital" da Europa. A neve cai, empurrada por um vento moderado. É um bonito espectáculo, um tanto melancólico. Melancolia que se acentua com a perspectiva da partida, daqui a poucas horas. As despedidas sempre foram momentos tristes. E são-no ainda. Sê-lo-ão sempre. Tornar-se-iam quase insuportáveis, não fora a esperança do reencontro. Foi uma semana linda de ternura, com um tempo maravilhoso. Vendo as imagens de ontem, chegadas de Londres, que sorte tivemos! O coração dos Pais sempre dividido: dois por aqui, dois lá por Lisboa. Mas a vida é assim mesmo e só tenho de dar graças a Deus pelos Filhos e Netos que nos deu. E tantas outras coisas boas, ao longo destes muitos anos de vida. Normalmente imerecidas. Por mim. Se tudo correr bem, pelas 16h 30m estaremos em Lisboa.
Até lá, se Deus quiser. Graças Lhe dou por tudo isto. Que foi muito, uma vez mais!!!
Claro, claro... cantar é fácil!
Este, hoje, também tinha de ser!!!
http://www.youtube.com/watch?v=w3ZXE0Ewzb8

domingo, fevereiro 01, 2009

Ich spreche keine Deutsch!!!

Pois!!! Tudo o que é bom acaba depressa. É já amanhã que temos de começar a arrumar as malas. Vale do Rur. Grande bacia carbonífera, a cerca de 40 kms de Colónia. Fomos lá dar uma espreitadela e aquilo é um cenário apocalíptico. Para além do ventinho a -1 C. Voltemos para o quentinho da casa. Os meus filhos foram inexcedíveis. O nosso neto, tão pequenino e tão lindo, é um bebé encantador. Demos e recebemos muito mimo. Fui obrigado a confessar que os meus filhos não são os mais bonitos do mundo. Francamente, os filhos deles é que lhes ganham. Olha, paciência! Não se pode ser bom em tudo!!!
Amanhã vamos regressar a Bruxelas. Agora dou-me conta que as apreensões sobre esta quebra de rotinas mais não eram do que o fruto da meu comodismo em não querer desinstalar-me. Depois, o tempo passou num instante e a saudade é já mais que muita.
Beethoven andou por aqui. Sei que vão gostar e eu aprecio amorosamente esta música amorosa